Nos últimos anos, a indústria do plástico vem desenvolvendo de forma mais acelerada novas tecnologias, a fim de criar produtos mais sustentáveis. Embora o plástico seja totalmente reciclável, ainda faltam políticas que façam com que o resíduo volte totalmente para a cadeia de produção. Sem novas práticas, a maior parte do que é descartado vai parar em aterros sanitários, lixões e mesmo nos oceanos. Por isso, encontrar o equilíbrio entre a produção e a conservação do meio ambiente é o atual desafio da indústria e dos gestores públicos.
Afinal, não é de hoje que o plástico faz parte de nossas vidas. Foi no início do século 20, entre 1907 e 1909, que o químico Leo Baekeland, belga radicado nos Estados Unidos, desenvolveu o produto que popularizou o plástico pelo mundo. Sua criação, o baquelite, foi criado a partir do processo de polimerização – conjunto de reações químicas que une moléculas simples (monômeros) em estruturas mais robustas e resistentes, os polímeros. De lá pra cá, a matéria-prima principal do plástico é o petróleo.
Não que em períodos anteriores a humanidade já não procurasse por materiais potencialmente modeláveis e resistentes ao calor e à pressão. É da Grécia antiga o termo plastikos, que significa flexível. Naquela época, porém, o que os gregos tinham era uma resina grudenta de origem vegetal, extraída de árvores da região. Hoje, o processo de fabricação é bem mais complexo.

A partir do baquelite de Baekeland surgiram todos os tipos de plástico que conhecemos. Alguns estão nas roupas, como o poliéster (criado em 1932) e o náilon (em 1938), outros em sua casa, como o PVC (de 1933) e o teflon (de 1941), ou podem até mesmo estar dentro do corpo, caso do silicone, cuja primeira versão foi comercializada em 1943.
A questão do plástico: descarte inadequado prejudica o meio ambiente
De acordo com um levantamento realizado por pesquisadores da Universidade da Geórgia e publicado na revista científica Science Advances, a humanidade já produziu nada menos que 8,3 bilhões de toneladas de plástico. E o material, pelo menos o mais usado, não é uma substância biodegradável, embora tenha potencial para ser até 100% reciclável.
Este é o problema. Embora todo tipo de plástico possa ser reciclado, segundo o estudo, apenas 9% de tudo que foi produzido teve esse destino. O restante foi incinerado (12%) ou acumulado em aterros sanitários e ambientes naturais (79%).
Hoje, de acordo com estudo produzido pelo departamento de ciência do governo do Reino Unido, já existem pelo menos 5,25 milhões de pedaços de plástico em águas marítimas. E, segundo o Fórum Econômico Mundial de Davos, se nada for feito, em 2050 a soma do peso de todo o plástico nos mares poderá ser maior do que a biomassa de peixes.
Os novos tipos de plástico
Há uma demanda natural pelo desenvolvimento de tipos inovadores de plástico. Os impactos ambiental e econômico são grandes: todos os anos, até US$ 120 bilhões são perdidos globalmente pelo abandono e descarte incorreto de embalagens plásticas, segundo o relatório The New Plastics Economy.
Por isso, companhias de escala global, empreendedores inovadores e universidades focadas em tecnologia e sustentabilidade vêm criando alternativas para produzir materiais mais amigáveis ao meio ambiente e para mudar o comportamento do consumidor.
Conheça quatro novos tipos de plástico:
Plástico verde: a revolução da cana-de-açúcar
Há 20 anos, a ideia de produzir plástico a partir de matérias-primas renováveis começava a ganhar força. Em 2005, se tornou realidade, quando teve início o primeiro ciclo de pesquisas para viabilidade produtiva e comercial deste novo produto. À época, gigantes petroquímicas anunciaram interesse na tecnologia – a Braskem, inclusive, investiu US$ 5 milhões apenas na fase de pesquisas. Deu certo. Em cinco anos, a empresa inaugurou a primeira planta de polietileno verde em escala comercial do mundo, localizada em Triunfo, no Rio Grande do Sul.
A instalação, que custou US$ 290 milhões, tem capacidade produtiva de 200 mil toneladas de polietileno verde por ano. E todo este plástico tem origem no mesmo insumo que produz açúcar e álcool: a cana-de-açúcar. Por se tratar de uma planta que se adapta bem a todas as regiões do país, com alta capacidade produtiva e custo de manejo baixo, a perspectiva é que seu uso cresça. Atualmente, apenas 65 mil hectares (ou 0,02% das áreas aráveis do país) são dedicadas ao produto.

O plástico verde tem como matéria-prima o etanol. Funciona assim: o etanol é desidratado e transformado em eteno verde que, em um processo químico, é polimerizado até resultar no polietileno – o plástico mais utilizado no mundo. Este polímero é utilizado para as mais diversas aplicações como embalagens, tubulações e até brinquedos.
Este ano, a fabricante de brinquedos Lego firmou a compra de plástico verde para compor suas peças. O material já é usado pela indústria para diversas funções, como polietileno de alta ou de baixa densidade, e já foi até mesmo para o espaço: a Estação Espacial Internacional da Nasa utiliza-o como matéria-prima para uma impressora 3D confeccionar ferramentas e peças de reposição para os astronautas.
Os produtos cuja composição tenha plástico verde recebem uma certificação: o selo I’m green. Não se trata de um produto biodegradável, mas o uso do termo “verde” tem seu porquê: além de ser produzido a partir de recursos renováveis, o plástico verde tem capacidade de captura de carbono na atmosfera. A planta de Triunfo, em sua capacidade máxima (200 mil toneladas), promove a captura de mais de 600 mil toneladas de CO2.
Plástico de mandioca: 100% biodegradável
Não é só a cana-de-açúcar que pode virar plástico. Há também soluções para a criação de polímeros a partir de vegetais ricos em amido, como milho, beterraba, batata e até mandioca. Esta raiz é a matéria-prima das embalagens produzidas pela CBPak.
Depois de perceber, em 2002, a necessidade de encontrar uma solução sustentável para o destino do lixo, sobretudo do plástico, Cláudio Bastos levou cinco anos desenvolvendo a tecnologia que pode transformar a fécula da mandioca em uma substância capaz de ser moldada como uma embalagem. E mais: uma embalagem que pode ser descartada e rapidamente biodegradada.
A ideia era ter em mãos uma matéria-prima que fosse de fonte renovável e pudesse se transformar em uma embalagem descartável. “Nossa motivação foi entender com certeza absoluta que as coisas mudariam, fosse com uma tecnologia ecológica ou de qualquer outro jeito. Enquanto não provarem que dá para morar em Marte, não temos um plano B”, afirma Stelvio Mazza, diretor geral da empresa.
São duas as vantagens da produção do bioplástico de mandioca. A primeira está na origem do insumo: trata-se de uma fonte renovável e cujo impacto na pegada de carbono é mais baixo. “E a mandioca está difundida pelo mundo todo, além do Brasil ser o quarto maior produtor. É um insumo abundante e que podemos comprar diretamente do pequeno produtor”, explica Stelvio. A segunda está no pós-consumo: as embalagens são compostáveis e podem ser depositadas junto com o lixo orgânico, afinal, se biodegradam em cerca de 90 dias.
Por outro lado, o preço pode impactar o crescimento do produto em larga escala. Uma unidade de embalagem bioplástica produzida pela CBPak pode custar até 15 vezes mais do que uma produzida a partir do plástico convencional. “O que vendemos não é só a embalagem, é uma solução ambiental em forma de embalagem. O nosso desafio é mostrar isso para o consumidor: que o produto dá retorno ambiental e de imagem”, argumenta o diretor geral da empresa.

A proposta vem dando certo. Hoje, a CBPak vende embalagens para empresas como Google e Facebook e tem demanda maior do que sua própria capacidade produtiva, mesmo depois da mudança da fábrica da empresa de São Carlos (SP) para uma maior no Rio de Janeiro.
Para quem se pergunta se é possível comer a embalagem, a resposta é não. Ainda que o produto seja confeccionado integralmente a partir da mandioca, ele é impermeabilizado depois de moldado – recebe uma película formada da mistura de resina orgânica e não orgânica, que compõe até 7% do produto final. Por isso, segundo a empresa, o bioplástico realmente não serve para o consumo humano, mas funciona muito bem como adubo orgânico.
Plástico muda de cor para ajudar consumidor
O nome técnico é polímero inteligente, mas a tecnologia poderia muito bem se chamar plástico camaleão. Trata-se de um plástico que poderá ser usado em embalagens e conseguirá comunicar informações a partir da mudança de cor. Por exemplo, quando um alimento começar a perder qualidade, sua composição bioquímica libera ou elimina compostos que poderão ser identificados pela embalagem.
“Estamos no início do desenvolvimento, mas já conseguimos resultados concretos em laboratório. Escolhemos desenvolver um polímero que mudasse de cor para indicar o estado de conservação de alimentos, através da variação de pH”, disse Marcia Pires, pesquisadora de ciência de polímeros da Braskem, em entrevista ao Let’s Talk Packaging.
A tecnologia é baseada em uma substância que pode funcionar como indicador. Ela é adicionada à poliolefina durante a produção do plástico e protegida para não se deteriorar ou ser eliminada em nenhuma etapa de fabricação ou utilização da embalagem. “Nossa tecnologia é a combinação da formulação de polímero e da proteção do indicador”, explicou Pires.
De acordo com a pesquisadora, embora o gatilho para a ativação do indicador que vem sendo desenvolvido seja o pH, é possível adaptar o produto para outros índices, como temperatura. A tecnologia poderá ser utilizada em qualquer tipo de plástico, inclusive em equipamentos de utilização médica e hospitalar, como em seringas.
Ainda não está definido um prazo para que a tecnologia chegue ao consumidor final.
Plástico molecularmente reciclável – para sempre
No laboratório do professor Eugene Chen, da Universidade de Colorado (EUA), surgiu um novo tipo de polímero que pode revolucionar a etapa do pós-consumo do plástico. Em um artigo publicado na revista científica Science, ele apresentou sua solução: uma substância com as mesmas características dos plásticos convencionais, mas que pode ser 100% reciclada, de forma mais rápida, barata e eficiente, via processo químico.
Chen e sua equipe focam seu trabalho no desenvolvimento de alternativas com menos impacto ecológico para produtos e processos químicos, como é o caso dos plásticos. Assim, dedicaram seus esforços para produzir um polímero orgânico que, após seu consumo, possa ser processado de volta às suas moléculas primárias, os monômeros.

“Os polímeros sintéticos são bem sucedidos pela mesma razão que são problemáticos. Nós amamos os plásticos porque eles são duráveis e fortes; é também por isso que a maioria deles não se degrada em aterros sanitários”, disse Chen em entrevista à revista da Universidade do Colorado.
Esses polímeros são formados por cadeias de ligações químicas longas e extremamente fortes. Quebrá-las e reaproveitá-las, hoje, é um procedimento complexo, com alto custo de tempo e dinheiro. O novo produto apresentado pelo cientista e sua equipe consegue processar integralmente a quebra em monômeros em poucos minutos e sem o uso de elementos químicos tóxicos – o que representa mais um ganho ecológico.
“Produzimos uma fusão trans-anel que torna o composto comumente considerado como não polimerizável em prontamente polimerizável, à temperatura ambiente e sem solvente, para produzir um polímero de alto peso molecular. Isto torna possível a repolimerização de um material verdadeiramente virgem para uso repetido infinitamente”, afirma o artigo.
“O nosso material será útil e poderá ter as mesmas propriedades que um plástico durável”, concluiu Chen. Por enquanto, o composto foi testado apenas em laboratório e, agora, a equipe se dedica a comprovar a viabilidade comercial do novo plástico.
Conteúdo publicado em 12 de julho de 2018