O gerente-executivo de meio ambiente da CNI comenta os compromissos e oportunidades da indústria brasileira ao investir em sustentabilidade e afirma que a economia circular deve interferir no futuro do setor

No Brasil, a participação da indústria no PIB (2017) é de 11,8%. O setor emprega cerca de 22% da força de trabalho brasileira. Fundamental para o desenvolvimento da economia e da sociedade, a indústria tem alto impacto ambiental na extração de recursos naturais e no consumo de energia.

Em 2018, a Confederação Nacional da Indústria (CNI), em parceria com o governo federal, desenvolveu e publicou o documento Mudança do Clima e Indústria Brasileira: iniciativas e recomendações estratégicas para a implementação da NDC (Contribuição Pretendida Nacionalmente Determinada) brasileira.

O texto apresenta propostas para a implementação e financiamento dos compromissos estabelecidos na NDC do Brasil ao Acordo de Paris. Davi Bomtempo, gerente-executivo de Meio Ambiente e Sustentabilidade da CNI, explica que o levantamento aponta caminhos para que a agenda climática gere novas oportunidades de negócios baseados no potencial de crescimento dos setores industriais, aumentando a eficiência e a geração de emprego e renda.

Em entrevista ao bluevision, Davi Bomtempo explicou os compromissos assumidos pela CNI para garantir práticas mais sustentáveis em todos os setores e etapas produtivas e firmar modelos de gestão eficientes do ponto de vista ambiental, além de comentar a importância das questões que formam o conceito de economia circular na economia das empresas de todo o mundo. Confira.

bluevision: Qual o papel da indústria e o que está sendo feito hoje na busca pelo desenvolvimento mais sustentável e o equilíbrio ambiental?

Davi Bomtempo: De uma forma geral, toda a indústria nacional desenvolve iniciativas para reduzir os impactos gerados por suas operações, sem perder de vista o custo-benefício de suas ações e o equilíbrio socioambiental. Entre as ações, há uso mais eficiente de energia, substituição gradativa dos combustíveis fósseis por fontes renováveis e manejo florestal sustentável. Na área de eficiência hídrica, crescem iniciativas de recirculação, reúso de água e dessalinização. Outra preocupação crescente é sobre a gestão de resíduos e, nesse sentido, vale destacar o aumento gradativo dos índices de reciclagem de resíduos e a implantação da economia circular em diversos setores. Tudo isso vem contribuir diretamente no uso mais eficiente de recursos naturais e para a consolidação de uma economia de baixa emissão de carbono no setor industrial brasileiro.

A CNI aponta que é preciso estabelecer novos modelos de financiamento para o desenvolvimento de energias mais limpas. O que falta de estrutura econômica, atualmente, para que a indústria avance mais nesse caminho?

DB: A consolidação de uma economia de baixa emissão de carbono muitas vezes passa pela implantação de tecnologias que ainda são disruptivas, havendo necessidade de um certo tempo para amadurecimento, quebra de barreiras e adequações das operações industriais a essa nova realidade. No entanto, algumas das atuais modalidades de financiamento existentes para baixo carbono não consideram os riscos envolvidos no uso dessas novas tecnologias, não apresentando, muitas vezes, a atratividade necessária.

No documento Contribuição da Indústria para a Agenda de Financiamento Climático, lançado pela CNI na COP-24, realizada no ano passado na Polônia, apresentamos as principais barreiras mapeadas pelo setor industrial para o acesso às fontes de financiamento para baixo carbono. Nesse documento, ressaltamos as principais recomendações, ao governo e ao mercado, para que possamos ter arranjos financeiros mais adequados a realidade da indústria. Entre as propostas, estão a criação de uma estrutura de governança para financiamento sobre o clima no Brasil, regras claras e justas para que a transição entre os mecanismos de mercado no âmbito do Acordo de Paris ofereça segurança jurídica suficiente para atrair investimentos do setor privado em projetos de redução de emissão, e reconhecimento de externalidades positivas nos projetos de baixo carbono a serem financiados.

E quais são as responsabilidades e atribuições que a indústria nacional precisa assumir para o Brasil perseguir resultados mais expressivos na perspectiva ambiental?

DB: A sustentabilidade faz parte da estratégia da indústria brasileira e a importância desse tema só cresce no setor, não apenas com foco no atendimento a questões legais, mas por consciência sobre a necessidade da conservação de recursos naturais para o próprio negócio e a qualidade de vida das pessoas. O setor industrial brasileiro possui o segundo melhor desempenho em termos de emissões de gases de efeito estufa. Entre os anos de 2005 e 2014, o crescimento das emissões do setor industrial foi de 19%, índice inferior ao crescimento do PIB Industrial no mesmo período, que foi de 23%.

Todo esse esforço em redução de emissões está sendo refletido na meta estabelecida no Plano Indústria do governo federal, que é de reduzir em 5% as emissões de gases de efeito estufa do setor em 2020. Projeções do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicações mostram que é de se esperar que, em 2020, as emissões de gases de efeito estufa da indústria estejam 46% abaixo da meta estabelecida pelo Plano Indústria.

Projeções do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicações mostram que é de se esperar que, em 2020, as emissões de gases de efeito estufa da indústria estejam 46% abaixo da meta estabelecida pelo Plano Indústria”.
– Davi Bomtempo

Do ponto de vista energético, a indústria brasileira é das mais limpas do mundo, mas ainda há margem para crescimento nos setores eólico e solar. O que vem sendo feito a respeito? E como essas novas fontes podem contribuir para gerar mais empregos e impacto social positivo, além do ambiental?

DB: Estudos da Organização Internacional do Trabalho (OIT) mostram que, até 2030, devem ser gerados em todo o mundo cerca de 24 milhões de novos empregos pela transição para a chamada “economia verde” ou de “baixo carbono”. No entanto, um ponto a ser levado em consideração, e que já é tratado nas negociações internacionais sobre mudança do clima, é a garantia de que essa transição deve ocorrer de forma justa para os trabalhadores que perderão seus postos de trabalho.

Há preocupação para que os trabalhadores sejam qualificados e preparados para essa nova realidade e assim realocados nas novas atribuições profissionais. Nesse sentido, o Sistema Indústria, por meio do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai), prepara trabalhadores para os segmentos de energias eólica e solar, mas também outras fontes renováveis, como a biomassa e até mesmo para os desafios impostos pela eficiência energética de processo. Tudo isso segue uma demanda de mercado que está sensivelmente alinhada à demanda de energia de forma segura e a um baixo custo.

No extrativismo e mineração, há amplo investimento em eficiência de recursos naturais, mas ainda há denúncias graves sobre garimpos ilegais, sobretudo na Amazônia.

DB: A ilegalidade, em qualquer que seja o setor econômico, deve ser tratada e combatida por órgãos fiscalizadores de governo. A indústria representada pela CNI é prejudicada pela concorrência desleal com atividades e produtos ilegais, que não atendem os requisitos mínimos quanto à tributação e ao cumprimento de regras ambientais e trabalhistas.

Ainda sobre extrativismo: o desmatamento também apresenta índices crescentes e preocupantes. Além do prejuízo ambiental, talvez irreversível, toda a indústria brasileira pode sofrer com sanções internacionais. O que pode ser feito sobre isso?

DB: É preciso separar desmatamento legal de desmatamento ilegal. O legal é realizado dentro dos parâmetros previstos em lei, em especial no novo Código Florestal (Lei 12.651/12), e após a autorização do órgão ambiental competente. O desmatamento ilegal não segue qualquer regra ou normativa e, geralmente, está vinculado a atividades ilícitas, como grilagem de terras, ou ao desconhecimento das leis.

Com relação ao “extrativismo vegetal”, o IBGE relaciona a atividade com toda coleta de produtos de florestas nativas ou naturais, abrangendo: alimentícios, borrachas, ceras, fibras, madeiras, oleaginosos, entre outros. No caso específico da madeira, que representa a maior parte da produção nesse segmento, a extração só é permitida por meio de manejo florestal sustentável, cujo plano deve ser aprovado pelo órgão ambiental competente. O Plano de Manejo Sustentável tem como premissa a manutenção da estrutura florestal e da biodiversidade, sendo considerado parte da estratégia de manutenção de florestas. Portanto, é um equívoco relacionar a agenda de extrativismo vegetal com o desmatamento.

A CNI apoia a indústria madeireira de base florestal nativa alicerçada no manejo florestal sustentável, que é uma atividade importante para a economia de vários estados brasileiros. Assim, para aprimorar a diferenciação da origem dos produtos florestais, o governo federal está implantando o Sistema Nacional de Controle da Origem dos Produtos Florestais (Sinaflor). Esse sistema será capaz de diferenciar a origem da madeira, se tem origem no desmatamento legal ou ilegal, e dará transparência à cadeia de custódia da madeira. A CNI apoia a iniciativa e está trabalhando fortemente com o governo federal na sua implantação.

Apoiadores da economia circular apontam um novo caminho para a produção de produtos e mercadorias: eles devem ser desenhados, desde o princípio, de forma circular de modo que nenhuma matéria-prima se perca – mesmo no pós-consumo. Quanto disso já é aplicado pela indústria brasileira e até onde podemos avançar neste sentido?

DB: A lógica adotada na economia circular privilegia a redução do desperdício e o aproveitamento dos materiais nos ciclos produtivos imitando o que a natureza faz ao reciclar materiais e nutrientes. Isso implica em criar e projetar produtos e serviços que permitam o seu máximo em termos de durabilidade e reciclabilidade e em desenvolver cadeias produtivas mais longas, que agregam mais valor aos produtos e permitam o seu uso por mais tempo. A CNI acompanha a discussão, e atualmente realiza estudos para avaliar seus impactos para a indústria e as oportunidades que esse novo modelo pode trazer para a geração de empregos e oportunidades.

Como o pensamento da economia circular pode remodelar o modo de produção?

DB: Ao trabalhar com o pensamento do ciclo de vida, os projetos de desenvolvimento de produtos e embalagens levam em consideração a necessidade do seu aproveitamento após o seu uso convencional, prevendo a possibilidade de reparos, recondicionamentos, reaproveitamento e reciclagem. Trata-se de uma valorização ao máximo de um produto em si e dos seus materiais. Essa mudança cultural impacta na relação produção-consumo e permite que as empresas e os consumidores se aproximem mais.

A economia circular é ampla e vai muito além da reciclagem. Toca em questões sensíveis das pessoas como a relação de possuir um bem ou apenas fazer uso do serviço prestado por ele, sem a sua propriedade. Essas questões, que estão no cerne da economia circular, devem impactar os negócios das empresas em todo o mundo. A CNI acompanha esse debate para apoiar a indústria brasileira para o futuro.

Conteúdo publicado em 25 de março de 2019

O que a Braskem está fazendo sobre isso?

No dia 7 de novembro de 2018, a Braskem lançou globalmente um novo Posicionamento Global sobre Economia Circular. No âmbito do posicionamento, a empresa vai atuar voluntariamente para atingir diversos objetivos, entre os quais se destacam o que garante que 100% das unidades industriais da petroquímica adotem as melhores práticas para controle de pellets até 2020.

A Braskem reconhece que a gestão adequada na disposição de resíduos plásticos pós-consumo é uma preocupação global crescente, e que o material deve ser usado com responsabilidade, reutilizado, reciclado ou recuperado. Para que isto aconteça, todos os setores da sociedade e cada cidadão devem atuar juntos na evolução do consumo consciente e na gestão do ciclo de vida do plástico.

Saiba mais sobre o compromisso assumido pela Braskem e as oito questões fundamentais sendo endereçadas para cumpri-lo em http://www.braskem.com/economiacircular

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