
Professora da rede pública de Porto Alegre, Aurici Azevedo da Rosa descobriu sua paixão pelo meio ambiente quando se encontrou com o cerrado brasileiro e, desde então, é ambientalista e ativista da educação na área
Como professora, sempre gostei de trabalhar com a realidade local. Quando morei em Brasília, o meu primeiro emprego foi em uma escola particular. No começo, tinha um preconceito muito grande com o cerrado. Quando vi aquelas árvores tortas e aquela terra vermelha achei uma coisa horrorosa. Mas, quando comecei a dar aula, quis conhecer melhor aquele ambiente. E descobri que, no cerrado, para uma planta crescer, ela precisa buscar água e sobreviver às queimadas. É uma luta enorme e me identifiquei com isso, já que a minha vida nunca foi muito fácil. Dentro da escola, criei um projeto chamado ‘Conheça o Cerrado para Amá-lo’ porque vi que os alunos não sabiam o que era o cerrado. A partir dali, passei a amar o cerrado de paixão e fui fazer curso de educação ambiental. Em 2003, quando voltei para o Rio Grande do Sul, para a cidade de Viamão, fiz a mesma coisa de sair e pesquisar o meio ambiente local. É a minha prática. Agora, na Lomba do Pinheiro (bairro de Porto Alegre), faço a mesma coisa. Hoje, faço trilha urbana com os alunos para que eles conheçam onde vivem e, a partir desse conhecimento, pensem na transformação desse local e no empoderamento deles mesmos.
Nascida e criada em Porto Alegre, a professora Aurici Azevedo da Rosa, de 55 anos, sempre gostou de ciências e sonhava em ser cientista, mas só foi descobrir sua paixão pelo meio ambiente depois de passar uma temporada em Brasília. Com licenciatura em Ciências e Biologia, e mestrado em Educação, ela acabou se tornando uma “cientista da educação”, como ela mesma se classifica. “Não consegui ser cientista – sou pobre, nasci pobre e tive que trabalhar muito para custear meus estudos. E, para ser cientista no Brasil, além de muita dedicação, é preciso ter tempo e condições de que nem todos dispõem. Mas eu tinha o sonho de fazer mestrado e, isso, consegui fazer. Hoje sou uma cientista da educação. Ainda tenho minha paixão pelas ciências exatas – física, química e matemática -, mas já me considero uma cientista dentro do que faço. Então não é uma frustração, pelo contrário”. Ela foi à Virada Sustentável de Porto Alegre para se atualizar, conhecer novas ideias e se inspirar.
Professora da rede pública, Aurici vem lutando para que a questão do meio ambiente tenha espaço nas escolas públicas, uma missão que ora fica mais fácil, ora mais difícil, conforme mudam os governos. Na escola em que dá aulas, ela chegou a desenvolver, por um período, o projeto de um “Laboratório de Inteligência do Ambiente Urbano”, criado com base no “Atlas Ambiental de Porto Alegre”, que mostra a história natural da capital gaúcha, com mapas temáticos, imagens de satélite, fotografias e diagramas. Durante anos, Aurici e seus alunos transformaram canteiros de terra dura da escola com plantas e até hortas comunitárias. Para ela, a compreensão da região em que a escola está inserida é fundamental para o aprendizado ambiental.
Explorar o meio ambiente local também é uma forma de empoderar os estudantes, segundo Aurici. Ex-professora de Viamão, cidade da região metropolitana de Porto Alegre, ela adotou, na cidade, a mesma técnica que desenvolveu em Brasília e usou suas aulas para ensinar sobre a região em que a escola estava localizada. Viamão faz parte da Área de Proteção Ambiental do Banhado Grande, região de pampa e mata atlântica, onde predominam restingas e banhados, além das nascentes do rio Gravataí. “A questão do adolescente é que temos que aproveitar a potência que eles têm, a rebeldia, para tentar tocar o coração deles. Quando tu conquista os adolescentes, eles vão estar contigo sempre. Mas é preciso ter muito jogo de cintura – com jeito, eles se sentem empoderados e participam de todos os projetos”, conta.
Além da infância pobre, Aurici também não teve uma juventude fácil. Foram muitas as dificuldades para sustentar o filho e bancar a própria educação, sem contar a perda de uma filha que ela prefere não comentar. Ainda assim, ela encontra forças para ser professora da rede pública e para criar oportunidades para quem tem poucas. “Minha opção por escolas públicas veio por eu ter tido muita dificuldade de conquistar o que eu conquistei. É minha forma de contribuição, de ajudar essa juventude. Me identifico com eles e essa é a minha maneira de contribuir com a sociedade. Meio utópico isso, eu sei”, afirma.
Mãe de Jonathan e avó de João, Aurici sabe que é um exemplo de luta. “Sempre mostrei para ao Jonathan que a gente tem de reivindicar os nossos direitos. E que isso precisa ser feito com respeito. Também me empenhei para mostrar que a base do saber é o conhecimento: ensinei sobre as questões ambientais, o respeito ao meio ambiente e o respeito aos menos favorecidos. Ele foi um menino criado num ambiente bem diferente do meu e teve muitas oportunidades. Então eu sempre insisto com ele: ‘nunca esquece de onde tu vem e quem tu é'”.
Conteúdo publicado em 8 de abril de 2018